sexta-feira, 9 de maio de 2014

A FALÊNCIA DO SISTEMA PRISIONAL NO BRASIL E SUAS CONSEQUÊNCIAS


1 – Introdução

O Sistema prisional é alvo de diversas matérias nos jornais onde se relatam as rebeliões ocorridas nos presídios e com frequência os detentos são mortos pelos companheiros ali presos, os colaboradores e funcionários juntamente com os familiares dos detentos são feitos de reféns e às vezes as fugas bem analisadas e planejadas são bem sucedidas.
O fato gerador de tantas rebeliões é a falta de estrutura dos presídios e a superlotação, que aumentam a fúria dos presos por estarem vivendo em péssimas condições, de saúde, higiene, alimentação, esquecidos até mesmo de serem libertados no prazo correto do cumprimento da pena, dentre outros graves fatores. 
Em alguns presídios os detentos são esquecidos, tratados com descaso sem nenhuma forma de dignidade. As penas não são aplicadas de forma correta e as regras e medidas não são cumpridas como realmente deveriam ser.            
A realidade dos presídios nos revela certamente que o sistema prisional está falido. A falta de apoio do governo, o descaso do Poder Público, a estruturação abalada, a superlotação, a falta de medidas para a verdadeira ressocialização dos presos, a falta de atividades, trabalhos para os presos para que estes ocupem seu tempo na cadeia com funções, trabalhos, estudos, algo que ajude e que faça os presos repensar e organizar seus pensamentos. Diante de tantas falhas não somente do Estado, assim como do Poder Judiciário, a maioria dos detentos depois de ter cumprido pena na prisão, acabam saindo piores que entraram, pois com o tempo ocioso aprendem novos crimes e suas estruturas psicológicas ficam ainda mais abaladas e agressivas, pois ali naquele ambiente eles passam por muita humilhação, sofrimento, exclusão, falta de respeito e dignidade.


2 – Breve origem histórica das prisões

Antigamente desconhecia-se a privação total de liberdade, o encarceramento e aprisionamento de delinqüentes não possuía caráter de pena, e sim de preservar os réus até seu julgamento ou execução. Os homens eram acorrentados, amarrados, pelos pés, pelas mãos e até mesmo pelo pescoço.  Como naquela época não haviam lugares específicos e arquitetados para se prender um criminoso, usavam então as cavernas, torres, castelos, aposentos abandonados, palácios, tudo para que o criminoso não fugisse ou para que ele trabalhasse.
  O Direito era exercido através da Lei de Talião, que ditava: "olho por olho, dente por dente” sendo que sua base era religiosa e vingativa.  As penas eram submetidas à escolha dos governantes da época. A forca, a roda e a guilhotina eram rodeadas por um determinado público, para presenciar a execução dos réus.
Nesta fase surgiu a prisão realizada pelo Estado, onde puniam com prisão os inimigos do poder real e os que cometiam traição.
No século XVI, começou a colocar em prática a criação e construção de prisões para o encarceramento dos delinqüentes já com a idéia do desenvolvimento das penas privativas de liberdade, desta forma todos que estivessem encarcerados seriam disciplinados e passariam a trabalhar internamente, originando os estabelecimentos penais.

2.1 Estabelecimentos penais

Os arts. 82 a 86 da Lei de Execução Penal dispõem sobre os estabelecimentos penitenciários. O art. 82 prevê os diferentes tipos de estabelecimentos penais, sendo eles os que se destinam a execução das penas privativas de liberdade; os que se destinam às medidas de segurança, dentre outros. A Lei de execução penal atendeu ao princípio da classificação penitenciária, que é prevista na Constituição Federal, art. 5º, inciso XLVIII. O art. 83 dispõe para o estabelecimento penitenciário, lugares com áreas de serviços para as atividades do tratamento reeducativo, sobrepondo-se às imposições de segurança interna.
Dentre os estabelecimentos penais se enquadram o Centro de Observação - onde corresponde ao exame criminológico do condenado destinando-o ao regime de liberdade em que "melhor se enquadra" (art. 96 LEP), a Penitenciária que se destina ao regime fechado (art. 87 LEP), sobrepondo também a idéia de que a penitenciária se define como estabelecimento de segurança máxima, a Colônia Agrícola para os que tiverem de cumprir penas em regime semiaberto, a Casa do Albergado  para os que forem cumprir penas em regime aberto, a Cadeia Pública, à custódia do preso provisório e cumprimento de pena de breve duração (art. 102 LEP).
 Nestes estabelecimentos, em regra, cada profissional deveria ter a sua sala separadamente para atendimento individualizado dos presos, como serviços de psicologia, psiquiatria, administrativo, advogados e autoridades. O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico que é destinado aos inimputáveis, e aos presos que dependem de substâncias químicas entorpecentes, causando dependência física e mental, Penitenciária para mulheres, Penitenciária para os jovens menores de 21 anos, que poderão permanecer no estabelecimento por necessidade do tratamento reeducativo e problemas de personalidade.

3 – Contribuições para a falência do Sistema Prisional no Brasil

O sistema penitenciário no Brasil  está falido, e toda a sociedade está ciente deste fato. As condições precárias que os presos vivenciam hoje são rodeadas de muita violência e descaso. Os presídios tornaram-se depósitos humanos, a superlotação gera violência sexual entre os presos, acarretamento de doenças graves, abuso do consumo de drogas, e uma convivência entre os presos onde o mais fraco se subordina ao mais forte.
Um fato que contribui como aumento da criminalidade nos últimos anos é a falta de estrutura física e de novos projetos nos presídios, ficando difícil comportar inúmeros presos que chegam todos os dias nas cadeias e penitenciárias de todo o país.
O artigo 5º, XLIX, da Constituição Federal, prevê que “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”, portanto o Estado não vem cumprindo seu papel há muito tempo, e a lei se perde no tempo. O descaso do governo é grande, e o Brasil está longe de mudar radicalmente essa situação. Nesse sentido:
“... É publico e notório que o sistema carcerário brasileiro ainda não se ajustou à programação visada pela LEP. Não há, reconhecidamente, presídio adequado ao idealismo programático da LEP. É verdade que, em face da carência absoluta dos presídios, notadamente no Brasil, os apenados recolhidos sempre reclamam mal-estar, mas acomodações, constrangimento ilegal, impossibilidade de readaptação à vida social. Por outro lado, é se sentir que, certamente, mal maior seria a reposição à convivência da sociedade de apenado não recuperado provavelmente, sem condições de com ela coexistir” HC 14.467-T Pleno-j. 7-8-1996-Rel. Des. Amaury Moura (RT736/685). (Idem, 2001, p. 193).

A corrupção, a falta de capacitação dos agentes, a higiene precária, a falta de assistência ao condenado e principalmente a falta de recursos do governo são fatores que contribuem para a falência do sistema prisional. Sendo assim, o Estado contribui para a prática de crimes, criando novos delinquentes perigosos, e permitindo, mesmo que indiretamente, que presos comandem crimes fora da prisão.

3.1 – Mudanças no sistema penitenciário

Mudanças drásticas são mais do que necessárias ao sistema penitenciário, pois hoje a prisão é apenas um depósito de lixo humano, ou seja, depósito de revoltas. A maioria das regras dentro dos presídios não são seguidas, devendo ocorrer uma reestruturação nessas regras e principalmente nas normas internas, pois não são cumpridas por grandes falhas, uma delas é na fiscalização de entrada de objetos, como celulares e drogas. Por intermédio do celular os presos mantêm contato com o mundo externo e comandam crimes com tamanha facilidade e consequentemente são informados por tudo o que acontece fora do presídio, e com a entrada das drogas os presídios se tornam verdadeiros centros de tráfico.     
Sabemos que as penitenciárias precisam de reformas, modernização, estruturação da arquitetura, descentralização de cadeias pelo país, ou seja, a construção de novas cadeias nos municípios, melhorias severas nas condições básicas de saúde e alimentação e uma grande atenção aos projetos para ocupação e ressocialização do preso, visando seu emprego garantido no mercado de trabalho após o cumprimento da pena. É de grande importância à separação entre os presidiários, e de grande valor um acompanhamento de sua reintegração na vida social.
Ressaltando que o art. 25 da LEP dispõe:

“A assistência ao egresso consiste:
I - na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade;
Il - na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses”.

4 - A população carcerária - Avaliação da População Prisional Brasileira - Jun/2013

Segundo dados do Depen, atualmente a população carcerária brasileira gira em torno de mais de 574.027 presos abrigados em 1.482 estabelecimentos cadastrados entre penitenciárias sendo 470 colônias agrícolas e industriais, 73 casas de albergado, 65 cadeias públicas, 826 hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico e 16 patronatos.
            Desses 537.790 encontram-se submetidos ao Sistema Penitenciário e 36.237 estão encarcerados nas Delegacias de Polícia. No país, temos um total de 317.733 vagas nas Secretarias de Administração Penitenciária registrando, portanto um déficit de vagas na ordem de 256.294. Percebe-se um aumento de 4,66% (24.292 presos) na população carcerária brasileira, já que em dezembro de 2012 havia registro de cerca de 549.735.

 5- Assistência Médica, alimentação e higiene

Dispõe a Lei de Execução Penal em seus artigos 12 e 14 que o preso ou internado, terá assistência material, em se tratando de higiene, a instalações higiênicas e acesso a atendimento médico farmacêutico e odontológico. Mas não é o que ocorre atualmente. Os presos estão submetidos a péssimas condições de higiene, alimentação e necessidades básicas. ROSA discorre que:

“A administração Do estabelecimento prisional tem que velar pelo estado físico e a saúde dos detentos que lhe estão confiados. É de sua máxima responsabilidade manter a higiene e o serviço sanitário no interior das prisões – observar a existência de doenças contagiosas e evitar a sua propagação, afastar situações de perigo. Higiene significa: manter limpos todos os locais da prisão, fornecer trajes decentes e asseados, instalações sanitárias e acomodações corretas aos presos. ( 1995, p 92)”.


As condições higiênicas em muitos dos presídios espalhados pelo país são precárias, atendimento médico então, é quase inexistente em alguns. Quem mais sofre pela carência de atendimento médico são as detentas, que necessitam de exames periódicos com ginecologistas. Muitas delas não possuem meios de transporte para levar as detentas ao ginecologista ou hospitais. Existem casos de detentas grávidas que necessitam de maiores cuidados e muitas vezes são mantidas algemadas ou com calcetes nos tornozelos no momento do parto em hospitais públicos do Estado de São Paulo. Desta forma as detentas passam por grandes constrangimentos além de dores.
Institui a Lei de Execução Penal:

“Art. 14. A assistência à saúde do preso e do internado de caráter preventivo e curativo compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico.
§ 1º (Vetado).
§ 2º Quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento.
§ 3o Será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido. (Incluído pela Lei nº 11.942, de 2009)”

Sendo assim, o Estado não anda cumprindo a legislação vigente, pois os sanitários são precários, com péssimas condições de uso e higiene. Muitos dos presos sem acompanhamento dos médicos acabam se infectando por doenças transmitidas sexualmente, principalmente a AIDS, fator este que também é transmitido por falta de conhecimento dos presos, sobre a prevenção da doença. Sem contar que muitos acabam chegando ao estado terminal sem qualquer assistência médica, ou até mesmo por parte da direção das penitenciárias. Mas não é somente as DSTS e a AIDS que predominam nos presídios, e sim muitos presos reclamam de doenças gástricas, urológicas, dermatites, pneumonias e ulcerações, por não ter uma boa higiene e por não serem atendidos adequadamente, nem submetidos a tratamentos muito menos medicações para aliviar a dor. A maioria sofre com o frio, por falta de vestimentas, porém usam a mesma roupa por muito tempo sem higienizar e tais casos não tão isolados acabam falecendo por falta de recursos primordiais para uma boa saúde.
6- Conclusão
O Sistema Prisional Brasileiro é ineficaz para a reabilitação do preso, em virtude do descaso por parte do Poder Público e do Estado, que compete em não investir o suficiente para a manutenção de um Sistema Prisional adequado que de fato atenda às normas jurídicas constitucionais e infraconstitucionais pertinentes à questão.
A superlotação, a falta de reintegração do preso na sociedade, o esquecimento do preso pelo Poder Judiciário no tocante a demora do atingimento do trânsito em julgado ou até mesmo a demora da liberação pelo Juiz com relação ao alvará de soltura, também contribuem para o agravamento da superlotação e rebeliões gerando ainda mais revolta.
Neste caso temos como consequência um grande círculo vicioso de violência que acaba não cessando o problema e causando ainda mais dificuldade na ressocialização do preso e falta de segurança à sociedade.
Para nosso país conseguir sair da falência do sistema prisional, entre outras medidas é necessário aumentar a fiscalização e atentar às questões relativas ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que atualmente não tem sido aplicado aos presos.
Com o encarceramento o Estado necessita visar a ressocialização do sentenciado, dando a ele o amparo para que não haja frustração e para que também não retorne a vida criminosa bem como a proteção e segurança da sociedade.


Referências bibliográficas

BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e Das Penas. São Paulo: RT, 1999.

BRASIL. Lei n.° 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, p. 10227, 13 jul. 1984.
MARCÃO, Renato. Lei de execução penal anotada. São Paulo: Saraiva, 2001.

NUCCI, Guilherme de Souza, Leis penais e processuais comentadas/ Guilherme de Souza Nucci.-5.ed.rev.atual.e ampl.- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

ARRUDA, Sande Nascimento. Sistema carcerário brasileiro. Revista Juridica uol, Ed.95 Disponível em: <http://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados-leis-jurisprudencia/59/artigo213019-5.asp> Acesso em: 25.abr.2014.

MAGNABOSCO, Danielle. Sistema penitenciário brasileiro: aspectos sociológicos. Jus Navigandi, Teresina, ano3, n.27, 23 dez. 1998. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/1010>.Acesso em: 28.abr.2014.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 45. ed. São Paulo:Saraiva, 2011.


Sistema Prisional. Departamento Penitenciário Nacional – Infopen (Sistema Nacional de Informações Penitenciarias – Ref. jun/2013) Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={D574E9CE-3C7D-437A-A5B6-22166AD2E896}&BrowserType=NN&LangID=pt-br&params=itemID%3D%7B364AC56A-DE92-4046-B46C-6B9CC447B586%7D%3B&UIPartUID=%7B2868BA3C-1C72-4347-BE11-A26F70F4CB26%7D> acesso em : 28.abr.2014.