sábado, 3 de maio de 2014

JURISDIÇÃO COLETIVA E COISA JULGADA


Elaborado em 04/2014
SUMÁRIO: 1. Introdução– 2. O que se entende por processo coletivo?- 2.1 Ação Coletiva Passiva –3. O que vem a ser Jurisdição Coletiva?- 4. Garantias Constitucionais. - 5. Coisa Julgada nas Ações Coletivas- 6. Conclusão
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1.  INTRODUÇÃO



                   O processo coletivo começou a partir da sua primeira regulamentação no direito norte-americano, em 1842, em virtude da necessidade de proteção dos interesses de massa que emergiram da Revolução Industrial, nas primeiras décadas do século XX. O direito coletivo só tende a se desenvolver, haja vista o processo irreversível de avanço das relações humanas entre si. Logo, é necessário o aprimoramento de todos os operadores do direito na ritualística coletiva e, em especial, na principiologia referente ao assunto. A sociedade moderna abre situações em que determinadas atividades podem trazer prejuízo aos interesses de grande número de pessoas, fazendo surgir problemas ignorados nas demandas individuais. O risco de tais lesões, que afetam inúmeros indivíduos e categorias inteiras de pessoas, constituindo um fenômeno cada vez mais amplo e frequente na sociedade contemporânea. A experiência brasileira com as ações coletivas e bem assim com os respectivos Processos e Jurisdição, pode ser considerada recente, ao menos em termos do que se poderia almejar como uma razoável sistematização normativa, sinalizada a partir do Código de defesa do Consumidor (Lei 4.717/75).
                   As ações coletivas permitem o amplo acesso à justiça ás demandas de massa, cujas peculiaridades exigem tratamento processual diferente daquele previsto para os litígios individuais.
Além disso, propiciam significativa redução do número de demandas propostas individualmente com origem comum, na medida em que, em um único processo, os conflitos são solucionados de maneira parecida.
Por fim, o processo coletivo é o instrumento adequado à efetivação dos direitos coletivos, seja por meio da aplicação do direito pelo órgão julgador em uma causa específica, seja de forma preventiva, visto que a punição de condutas ilícitas gera estímulo para o cumprimento voluntário do direito pela sociedade.
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2.                O QUE SE ENTENDE POR PROCESSO COLETIVO?


O processo coletivo possui diversas peculiaridades em relação ao de cunho individualista, a começar por sua regulamentação, que se encontra dispersa em vários diplomas legais, cuja relação intercambiante constitui um microssistema processual coletivo.                                                                    Entre as características principais do processo coletivo, podemos citar seu objeto, que consistente em direitos difusos, coletivos em sentido estrito ou individuais homogêneos, a legitimidade ad causam, que é atribuída pela lei a entidades que não são titulares do direito discutido em juízo, e os mecanismos de formação da coisa julgada coletiva e sua extensão ou transporte ao plano individualista.
De outro lado, não configura processo coletivo a reunião de pedidos de uma só ação, ou mesmo a reunião de ações conexas, ou por continência (CPC, arts. 292, 103, 104). Tais ocorrências, sem intuito de proporcionarem uma compactação do procedimento, e prever a otimização da resposta judiciária, na verdade, apresentam- se como aglutinação de posições individuais justapostas, ora como cumulação de pretensões, não permitindo extrair uma essência proporcionalmente coletiva, que é o que configura os veros conflitos metaindividuais, como nos embates de largo aspecto, contrapondo segmentos sociais e econômicos.
Conforme visto, atualmente, o Processo Civil não pode mais ser pensado somente a partir da sistemática estabelecida pelo Código de Processo Civil, diante das diversas transformações ocorridas posteriormente à codificação de 1973, instituídas não apenas pela Constituição Federal, como também por diversos diplomas legais, que passaram a normatizar o chamado “processo civil coletivo”.
Esse tipo de processo, cujo objeto fina é proporcionar o maior e melhor acesso à justiça para todos os cidadãos é destinado a regular a tutela jurisdicional dos direitos transindividuais, quais sejam, aqueles que transcendem a esfera individual, classificados no parágrafo único do art. 81 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor em interesse difuso, coletivo e individual homogêneo.
Seu referencial normativo é formado pelo conjunto vindo da interação entre a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e parte do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), criada pelos arts. 21 e 90 de cada um desses diplomas legislativos, respectivamente, formando um verdadeiro sistema de processo civil, ou seja, unido e ordenado, embora não integrem o Código de Processo Civil.
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2.1           AÇÃO COLETIVA PASSIVA.


Em determinadas ocasiões, um grupo ou uma coletividade pode ser inserida no polo passivo da demanda processual, caso em que haverá ação coletiva passiva. Nesse tipo de demanda, o objeto corresponde a uma situação jurídica coletiva passiva, ou seja, a um dever ou estado de sujeição de determinado grupo em relação à parte autora, ou seja, a ação em que o grupo consta no polo passivo da relação processual.
Sendo assim, é possível a aplicação da ação coletiva passiva no Código de Defesa do Consumidor, desde que seja realizada a aferição da representatividade adequada pelo magistrado, tornando- se possível a extensão da coisa julgada a todos os membros da coletividade demandada. Sua viabilidade se justifica pela impossibilidade de limitação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição.
Quanto às espécies de ação coletiva passiva, tem-se que elas podem ser de duas espécies, ordinária ou comum, e duplamente coletiva. Seria a ação coletiva comum ou ordinária, segundo a qual no polo ativo da demanda figuraria uma ou mais pessoas, em face de uma dada coletividade.
Temos ação coletiva passiva quando um agrupamento humano for colocado como sujeito passivo de uma relação jurídica afirmada na petição inicial. Formula-se demanda contra uma dada coletividade. Os direitos afirmados pelo autor da demanda coletiva podem ser individuais ou coletivos (lato sensu) – nessa última hipótese, há uma ação duplamente coletiva, pois o conflito de interesses envolve duas comunidades distintas.
Seguindo o regime jurídico de toda ação coletiva, exige-se para a admissibilidade da ação coletiva passiva que a demanda seja proposta contra um representante adequado (legitimado extraordinário para a defesa de uma situação jurídica coletiva) e que a causa seja revestida de “interesse social”. Neste aspecto, portanto, não há nada de peculiar na ação coletiva passiva.
O que torna a ação coletiva passiva digna de um tratamento diferenciado é a circunstância de a situação jurídica titularizada pela coletividade encontrar-se no polo passivo do processo. A demanda é dirigida contra uma coletividade, sujeita de uma situação jurídica passiva (um dever ou um estado de sujeição, por exemplo). Da mesma forma que a coletividade pode ser titular de direitos (situação jurídica ativa), ela também pode ser titular de um dever ou um estado de sujeição (situações jurídicas passivas).
Portanto, haverá uma ação coletiva passiva em toda demanda onde estiver em jogo uma situação coletiva passiva. Seja relacionada a um direito individual ou seja relacionada a um direito coletivo.
A ação coletiva passiva pode ser classificada em original ou derivada. Ação coletiva passiva original é a que dá início a um processo coletivo, sem qualquer vinculação a um processo anterior. Ação coletiva passiva derivada é aquela que decorre de um processo coletivo “ativo” anterior e é proposta pelo réu do processo, como a ação de rescisão da sentença coletiva e a ação cautelar incidental a um processo coletivo. A classificação é importante, pois nas ações coletivas passivas derivadas não haverá problema na identificação do representante adequado, que será aquele legitimado que propôs a ação coletiva onde teve sua origem.
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3.                  O QUE VEM A SER JURISDIÇÃO COLETIVA?


A palavra jurisdição tem origem latina, formada de juris e de dictio, que significa dicção do direito. Foi definida por muitos artigos como “o poder de dizer ou aplicar o direito”.
O conceito tradicional de jurisdição pode ser entendido como atividade do Poder Judiciário, sendo o dever- poder legal de, aplicando a lei, conhecer e julgar os litígios ou conflitos de interesses executando os julgados respectivos.
No âmbito do processo civil clássico, a competência nas demandas de cunho reparatório ou condenatório utiliza-se, em regra, do critério territorial. Portanto, assume caráter relativo, podendo ser modificada pela conexão ou continência. Todavia, tais premissas não se aplicam ao processo coletivo. A lei estabeleceu regras específicas de competência para as ações civis públicas ou coletivas, com o objetivo de facilitar a defesa dos direitos transindividuais em juízo.
No caso dos direitos difusos ou coletivos, as demandas deverão ser propostas no foro do local onde ocorreu o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa. O objetivo dessa norma é possibilitar melhor instrução e coleta de provas, permitindo que o juiz que teve mais contato com o dano julgue os pedidos.
Para entender a jurisdição coletiva, enquanto espécie distinta da jurisdição individual é necessário entender os interesses metaindividuais.
Interesses Metaindividuais ou Transindividuais, na maioria das vezes não se mostram como públicos, nem mesmo como privados. Esses interesses não possuem um titular determinado, mas, sim uma grande quantidade de indivíduos (grupos, classes ou categoria de pessoas). São interesses que sem constituir interesse público, ultrapassam o campo do individual, alcançando sua finalidade e imparcialidade.
A partir dos anos 80 a legislação brasileira trouxe institutos para a tutela coletiva dos interesses metaindividuais. Isso se deu principalmente pela edição da Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) e posteriormente pela Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), invejada no campo internacional.
Os interesses transindividuais possuem três interpretações, ou seja, interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos (Art. 81 e incisos da Lei 8.078/90).
Interesses difusos são aqueles que se encontram no ápice da coletivização dos interesses. Ultrapassam a esfera do interesse público, social e geral, pois derivam da noção de direito natural, como por exemplo, a qualidade de vida, à proteção ecológica, ao respeito às etnias e minorias.
Coletivos são aqueles que restringem a valores pertencentes a grupos sociais ou categoria de pessoas bem definidos, uma associação de indivíduos, e não os seus integrantes, como por exemplo, a categoria dos médicos, que nesse contexto, somente médicos são titulares daquele interesse, não se estendendo a qualquer outro profissional.
Individuais homogêneos são aqueles em que os que nascem de um fato comum a todos de uma mesma coletividade. Tem natureza, individual, e na maioria dos casos, patrimonial. Mas, o que justifica a sua transindividualidade é que apesar da origem comum, o interesse daquele individuo é semelhante ao de vários outros. Desse modo, se estabelecerá um ponto de ligação entre os indivíduos atingidos em seu interesse.
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4.                GARANTIAS CONSTITUCIONAIS


Como ditado em seu Preâmbulo, nossa Constituição Federal de 1988 foi promulgada sob a perspectiva de se instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.
De acordo com sua Corte Constitucional, para a específica e valiosa missão de tutela dos necessitados e de outros grupos sociais vulneráveis a Constituição de 1988 cria e estabelece a Defensoria Pública como sua instituição permanente essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe como expressão e instrumento do regime democrático fundamentalmente a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos  necessitados.
A parte constitucional da tutela coletiva, além daqueles artigos 5º, que falam de mandado segurança coletivo, ação popular, além do artigo 129 que fala das atribuições do MP, é o artigo 5º, inciso XXXV principalmente. Ainda que não tivesse mandado de segurança coletivo na constituição, ações populares, legitimidade do MP, poderiam extrair toda a proteção dos direitos coletivos desse artigo 5º, inciso XXXV.
Quando falamos em tutela coletiva, é tutela jurisdicional coletiva. Tutela jurisdicional é a proteção que o estado confere ao direito de alguém. Então, quando falamos em tutela jurisdicional coletiva estamos falando na proteção do direito coletivo contrapondo a tutela jurisdicional individual, proteção de direitos individuais.
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5.                COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS


A coisa julgada no processo coletivo é prevista pelos artigos 103 e 104 do CDC e pelo CPC. Coisa julgada pode ser definida como a qualidade de imutabilidade, de indiscutibilidade de que se reveste a sentença, mais especificamente a parte dispositiva desta (limite objetivo) e, via de regra, em relação às partes processuais (limite subjetivo). Tal imutabilidade pode ocorrer apenas dentro do processo em que foi proferida a sentença, impedindo que ela seja revista no próprio processo (coisa julgada formal) ou fora do processo em que foi proferida a sentença, impedindo que ela seja modificada em outro processo (coisa julgada material).    
 Encontra- se fundamento no artigo 5º, XXXVI, da CF, tendo como escopo proporcionar segurança jurídica, estabilidade às relações sociais e evitar julgados conflitantes.  Uma das características da jurisdição é exatamente a coisa julgada/imutabilidade das decisões, pois de nada adiantaria submeter uma pretensão ao Estado-Juiz se a decisão por este proferida não fosse imperativa e imutável. A coisa julgada é um dos pressupostos processuais negativos ou acessórios. A existência de coisa julgada material é um impedimento à instauração de outro processo. Caso seja proposta nova ação, verificando o juiz a existência de coisa julgada anterior, caberá extinguir o processo sem julgamento de mérito, conforme art. 267, V, do CPC. Caso o juiz não verifique isso ao despachar a inicial, poderá ser verificado posteriormente, pois se trata de matéria de ordem pública, não sujeita a preclusão, que pode ser conhecida a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição (art. 267, §3º, do CPC). Não sendo conhecida de ofício, cabe ao réu admitir a existência de coisa julgada anterior na contestação ou posteriormente, a qualquer tempo; se proferida sentença de mérito, pode a matéria ser suscitada em sede recursal ou, após o trânsito em julgado, por meio de ação rescisória (art. 485 do CPC). Havendo duas coisas julgadas, deve prevalecerá a primeira. A coisa julgada formal pode ser definida como a "preclusão máxima" do processo, uma vez que, depois de ela se formar, não podem as partes exercer qualquer faculdade processual. A coisa julgada formal se opera dentro do processo, ou seja, produzindo efeitos endoprocessuais, impedindo as partes entre as quais foi dada a sentença de discutir dentro daquele processo a matéria julgada. Não obsta, contudo, a propositura de nova ação com o mesmo objeto daquela já decidida. A coisa julgada material, por sua vez, se opera para fora do processo no qual foi proferida a sentença, produzindo efeitos extraprocessualmente, impedindo, portanto, a propositura de outra ação que tenha por objeto a lide discutida e decidida no processo findo.  
Quando os efeitos da coisa julgada afetarão a todos? Quando se tratar de defesa de direitos difusos. Mesmo que haja indenizações individuais. Ou também quando tratar-se de direito individual homogêneo. Então determinada sentença que tutele o direito difuso terá efeito erga omnes, desde que a ação não seja julgada improcedente por falta de provas. Na tutela de direitos individuais homogêneos o efeito também é erga omnes (para todos).
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CONCLUSÃO


Em relação a tutela coletiva, o Ministério Público Federal atua para defender os interesses difusos, interesses que não são específicos de uma pessoa ou grupo de indivíduos, mas de toda a sociedade, como o direito de todos respirarem ar puro; coletivos, interesses de um grupo, categoria ou classes ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica e individual homogênea, que têm um fato gerador comum, ou seja, atingem as pessoas individualmente e da mesma forma, mas não podem ser considerados individuais, como os direitos do consumidor. Entendendo-se o Direito como instrumento regulador das relações jurídicas na sociedade, tornando possível a convivência pacífica entre os diferentes atores sociais, conclui-se que ele deve se alterar sempre que necessário a fim de acompanhar as alterações sociais.

Bibliografia

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CONSTITUIÇÃO FEDERAL – de 5 de outubro de 1988.